domingo, 24 de novembro de 2013

Do Espichel às terras de Alcube: travessia da Arrábida

A vinda à capital de uma das companheiras de "aventura" do Monte Perdido Extrem, residente na capital nortenha, mobilizou um grupo de outros companheiros para uma "aventura" mais perto de nós.
Santuário da Srª do Cabo, 22.11.2013, 8:45h
Começa a grande travessia do litoral da Arrábida
Delineada quando nos voltámos a juntar no regresso às terras "mágicas" do Gerês, em Outubro passado, combinámos esta "aventura" para as cristas da península de Setúbal, numa travessia de cerca de 45 km, entre o Cabo Espichel e as terras de Azeitão, pelas praias desertas da Arrábida, Cristas do Risco, El Carmen e terras de Alcube. E acabámos por contar com toda a equipa que completou aquela aventura pirenaica ... além de outros doze caminheiros "aventureiros"...
E assim, antes das nove da manhã de sexta feira, estávamos no Santuário de Nossa Senhora do Cabo Espichel, para começarmos naquele ermo, onde a terra se acaba e o mar começa, uma fabulosa travessia pelo litoral da Arrábida. O dia estava feioso, a ameaçar chuva, mas com o Sol a espreitar timidamente por entre as nuvens baixas e a deixar reflexos mágicos no mar.

Praia dos Lagosteiros, Cabo Espichel
E o dia estava mágico...
Esta travessia foi uma sucessiva descoberta de recantos paradisíacos: falésias abruptas, grutas, arcos naturais, praias escondidas e desertas, ruínas de velhas fortificações, como o farolim e o Forte da Baralha … cantos e recantos que nos remotos "anos loucos" de 1970 a 1972 eu conheci vistos do mar, na prática de uma das minhas paixões de então, o mergulho amador!
Arco natural junto à Chã dos Navegantes
Destino também frequente de acampamentos e pequenos passeios de há 20, 30 e mais anos, a Arrábida ficou no entanto de certo modo esquecida quando a minha veia de caminheiro se intensificou, como já o disse algumas vezes nestas minhas memórias. Em boa hora conheci quem me viesse a revelar os seus segredos! O mentor de mais esta caminhada por terras da Arrábida conhece-a palmo a palmo, gruta a gruta, recanto a recanto, deixando transparecer em cada curva do caminho, em cada nova panorâmica, a paixão que as muitas descobertas por estes trilhos místicos foram construindo e alimentando. Obrigado Araújo! Tal como a "White Angel" para as terras mágicas do Gerês … tu transportas em ti a alma destes carrascos e medronheiros, das águas azuis cristal das praias perdidas no fundo de falésias abruptas, dos mistérios das grutas que conduzem às entranhas da terra, ou talvez mesmo aos mistérios da nossa própria alma, numa catarse purificadora  … talvez sonhando!
Das praias desertas que descobrimos ao longo desta travessia, merecem especial destaque a da Baleeira, a que descemos pouco depois do Forte da Baralha, e a da Ribeira do Cavalo, já relativamente próxima do Porto de Abrigo de Sesimbra e do final da nossa primeira "etapa".

Forte da
Baralha
Praia da Baleeira
Sucedem-se as panorâmicas litorais
Nas grutas que levam às entranhas da terra...
Exercícios de levitação...
Vindos de poente, como foi o caso, a praia da Ribeira do Cavalo aparece-nos por entre a vegetação, lá em baixo, em forma de um autêntico coração, delimitado no mar pela diferente coloração das águas, provocada pela concentração de materiais calcários de escorrência nas baixas profundidades da pequena baía. Um autêntico quadro de paraíso, completado por enormes bandos de gaivotas que, no dia meio chuvoso, já se preparavam para repousar na areia, quando um outro "bando", este de 10 caminheiros aventureiros, desceu até àquelas paragens convidativas ao sonho e à meditação.

No paraíso perdido da Praia da Ribeira do Cavalo
Completada a primeira etapa em Sesimbra ... o jantar não podia deixar de ser no velho "Tic-Tic" ... a lembrar também os velhos tempos do mergulho ... noutras eras ... com outras gentes...!
E o segundo dia de travessia acordou idêntico: chuva miudinha, nuvens baixas, nevoeiro. O nosso destino era agora a Crista da Serra do Risco, numa travessia que se tornou bastante lenta, particularmente nos lapiás, escorregadios como manteiga.

Sesimbra numa manhã cinzenta e fria, 23.Nov.2013
Sobre o litoral da
Ponta de S. Pedro
Nomes como o do Cabo de Ares e da Ponta de S. Pedro, que mais uma vez eu conhecia dos velhos tempos do mergulho, sucediam-se agora na carta, à medida que progredíamos pela crista daquela que é a escarpa litoral calcária mais elevada da Europa. Num dia 9 de Agosto do longínquo ano de 1972 (há 41 anos…!) … eu mergulhava a 65 metros de profundidade, ao largo da Ponta de S. Pedro, a partir da velha barca do Joaquim Zé, que largara como sempre do velho porto de abrigo de Sesimbra.

Baía da Armação
Geodésico do Píncaro (380m alt.)
Em dia de chuva miudinha, nas Cristas do Risco
Sobre a Praia dos Penedos e Barbas de Cavalo
Descemos da Crista do Risco para o Campo da Vitória
A arriba da Serra do Risco corresponde a um doma, ao contrário de outros relevos da região, constituídos por dobras. O seu aspecto distinto levou Sebastião da Gama a descrevê-la como uma onda:

"A Serra tem o ar de uma onda que avança impetuosa e subitamente estaca e se esculpe no ar; é uma onda de pedra e mato, é o fóssil de uma onda. Ri-se do mar de agora, gaivota mansinha, profundamente azul, que faz avultar, com a planície que lhe fica à esquerda, o seu dorso gigantesco."
Sebastião da Gama
Ao fim da manhã o dia lá foi melhorando, deixando-nos finalmente ver o mar aos nossos pés, a península de Tróia ao fundo, o Campo da Vitória e as terras de El Carmen a nordeste.

Horas de
almoço...
Nós viemos mesmo dali?... (Campo da Vitória e Crista do Risco, ao fundo)
Atravessado o Campo da Vitória, o rumo era agora o cume da Arrábida, o Formosinho. Mas a progressão lenta nos lapiás do Risco fez-nos optar por contornar a Serra a poente, pelas terras de El Carmen. A quinta de El Carmen é um local histórico, onde viveu um importante fidalgo castelhano que havia de se tornar mais tarde no famoso Frei Martinho de Stª Maria, fundador do Convento da Arrábida.

Ermitério de El Carmen
Contornamos o Formosinho ...
... a caminho do parque de Campismo de Picheleiros
Pelos Casais da Serra começámos a contornar a encosta norte da serra, com o Formosinho a vigiar-nos. Às três da tarde estávamos no parque de campismo de Picheleiros, continuando para nordeste, para a Serra do Cuco. Numa tarde a declinar, os horizontes foram-se continuando a limpar, deixando-nos ver já o Tejo, a baía do Seixal e a Serra de Sintra, em tons de um pôr-do-Sol que já se avizinhava.


A Baía do Seixal e o Tejo,
do Moinho do Cuco
Ao fundo a Serra de Sintra, em tons de pôr-do-Sol (do Moinho do Cuco)
E assim, com 43 km nos pés nestes dois dias fabulosos, antes das quatro e meia estávamos a entrar na Quinta do Alcube, no Alto das Necessidades, com o castelo de Palmela e o Monte de S. Luís à nossa frente e uma espectacular panorâmica para o Vale da Rasca.

Vale da Rasca, do Alto das Necessidades
A Quinta do Alcube é já bem conhecida deste grupo de caminheiros "aventureiros". Produtora de alguns dos melhores vinhos da Península de Setúbal ... ali terminámos esta nossa travessia da Arrábida, com um pequeno lanche e prova de saborosos néctares. Depois ... havia que voltar a Sesimbra, onde estavam alguns dos carros ... e onde estava a minha companheira de aventuras, que fez a primeira destas duas etapas mas preferiu ficar a descansar na segunda, na companhia da "cara-metade" de outro dos que completaram os 43 km da travessia.
Ver álbum completo
Obrigado, companheiros, por mais estes dois dias de camaradagem, de "aventura", de vida ao ar livre! Obrigado, Araújo, pela tua paixão pela Arrábida e por tão bem a partilhares com todos os que te acompanham!

domingo, 17 de novembro de 2013

Nas faldas da Gardunha ... na senda dos Míscaros

Alcaide é uma bonita aldeia, no sopé da Serra da Gardunha, com uma vista espectacular sobre a Cova da Beira. De há alguns anos a esta parte, a Liga dos Amigos do Alcaide organiza um dos mais conceituados festivais gastronómicos do Concelho do Fundão - "Míscaros - Festival do Cogumelo".
Ora, no calendário de actividades da minha "família" caminheira, a caminhada de Novembro estava agendada precisamente para as terras da Gardunha, com aquele Festival como tema central. Duas caminhadas, uma na encosta sudeste da serra, à volta da bonita vila da Soalheira, e outra na encosta nordeste, centrada na aldeia de Alcaide, onde desde sexta feira decorria o já referido festival.
E assim, antes das onze da manhã de ontem, estávamos a iniciar a primeira jornada deste fim de semana micológico, junto ao apeadeiro da Soalheira. Depois de alguma chuva que viemos a saber que tinha caído nas horas anteriores, a Gardunha mostrou-se bem colorida, coberta apenas de início por um manto de nuvens brancas que escondiam os seus cumes. O frio ... esse era bem maior do que este outono tem sido até ao presente. Na Estrela já haviam caído as primeiras neves...

Começou a caminhada, com a Gardunha em pano de fundo
O almoço foi em S. Fiel ... a recordar-nos o "mágico" Festival de sagração ao Solstício que eu e a minha parceira ali vivemos em Junho. As cores da Gardunha eram agora contudo as do Outono.

S. Fiel em tons de Outono
Antes das três da tarde estávamos a entrar na vila da Soalheira ... terra natal do dinamizador desta caminhada. E que bem sabe sentir-lhe o amor pela sua terra, posto no empenho de organização, nas palavras ... nas surpresas: finda a caminhada, na Misericórdia da Soalheira, não só tinha mobilizado um mega magusto que estava no programa, como nos brindou a todos com uma exibição do Grupo Coral da Soalheira! A música da Beira Baixa, a música popular portuguesa, a música do grande Arlindo de Carvalho voltou a encantar-nos, tal como já nos encantara no Solstício.

A Soalheira está à vista ...
... cai a tarde ...
... e chega o Canto (Grupo Coral da Soalheira)
Alcaide, 21:15h - Míscaros ... o festival do cogumelo!
À noite, já na aldeia de Alcaide, passeámos pelas habituais tasquinhas, tradicionais neste tipo de eventos, ao som dos bombos e gaitas de foles das arruadas. Um belo sábado, uma bela caminhada, um belo convívio ... com queimada galega!
Para terminar ...
uma bela queimada!
17.Nov. - Passeio micológico, sob a orientação do Engº Gravito Henriques
Hoje, domingo ... era o dia da integração nas actividades dos "Míscaros - Festival do Cogumelo". Começámos por um "passeio micológico", orientado pelo Eng.º Gravito Henriques, especialista que nos descreveu os cogumelos um por um, ensinando a distinguir frades, tortulhos e míscaros e quais os cuidados a ter com os cogumelos silvestres. A "caminhada" reduziu-se a uns curtos dois quilómetros e pouco, mas, para além dos ensinamentos do Engº Gravito, permitiu admirar as espectaculares cores outonais da encosta nordeste da Gardunha.

Cores outonais, nas encostas do Alcaide
De regresso à aldeia de Alcaide ... esperava-nos um mega almoço de arroz de míscaros, confeccionado pelos alunos da Escola de Hotelaria do Fundão. E ...estava divinal! De novo ao som dos bombos, gaitas, flautas e vozes ... aquele almoço e as horas que se seguiram nas ruinhas e tasquinhas marcariam o fim deste belo fim de semana em terras da Gardunha ... as terras onde um dia eu cheguei a pé, vindo das terras da Malcata e da "minha" Vale de Espinho...

Um mega almoço com
um belo arroz de míscaros!
Nas faldas da Gardunha
(Álbum completo)