domingo, 11 de agosto de 2013

Assombrações e Portais da Serra da Lua

Conhecida na antiguidade como Monte da Lua, Serra Solércia ou Monte Sagrado, a Serra de Sintra sempre foi considerada como sagrada desde tempos imemoriais. As suas lendas, narrativas, história e esoterismo conferem-lhe o estatuto de Serra Sagrada por antigos e clássicos. Entre alguns locais particularmente encantatórios, destacam-se a Quinta da Regaleira, as grutas do Castelo dos Mouros, a demanda do Santo Graal e o Parque da Pena, o Convento dos Capuchos e a alquimia, as inscrições hindus da Penha Verde, o Palácio da Vila, os templários e os árabes de Sintra, a célebre profecia da Serra da Lua, ou ainda Mafra e o V Império, Cascais e a enigmática "Boca do Inferno".
É neste contexto que a "Casa do Fauno" tem dinamizado uma série de caminhadas nocturnas, sob o tema geral "Sintra Assombrada". O tema - e a própria "Casa do Fauno" - há algum tempo que me haviam despertado a curiosidade ... e a oportunidade surgiu neste sábado, em que o "desafio" eram as "Assombrações e Portais da Serra".
Acompanhado pela minha "donzela encantada", aproveitámos para ir conhecer a Casa e a sua espectacular envolvência, propícia desde logo aos voos da imaginação e do esoterismo. A Casa do Fauno situa-se no coração da Serra de Sintra, por entre carvalhos, azevinhos e outro arvoredo, dentro da Quinta dos Lobos, num terreno que em tempos fez parte da floresta de Almosquer, doada por D. Afonso Henriques aos Cavaleiros Templários, no séc. XII.
«Aqui neste mesmo caminho,
aqui mesmo ontem
o Rei Fauno saltava.
Ele cantava, despreocupadamente e em voz alta,
vociferando o seu nome.
Ele cantava, no meio dos ramos de carvalho,
passando de rocha em rocha,
mantendo-se protegido:
"Aqui o Fauno é livre,
aqui o Fauno é livre!
(Robert Graves, Fauno)                                                                        
Não estávamos longe de outro local bem ligado ao esoterismo, a Quinta e o Palácio da Regaleira, verdadeira mansão filosofal de inspiração alquímica. E assim, às dez da noite lá estávamos nós na "Casa do Fauno", prontos para recebermos o que a organização nos propunha:
"Que os Portais da Serra se abram para nós e nos levem a outras dimensões,
que o nefasto não nos atinja mas que se nos revele!
"
A Casa do Fauno, na Quinta dos
Lobos, Caminho dos Frades, Sintra
Os candidatos à revelação eram ainda umas boas dezenas de pessoas. Durante quase quatro horas, ouvimos lendas e mitos de lugares carregados de energias sobrenaturais. Maria João Martinho, a guia desta invulgar caminhada, narrava histórias de fenómenos insólitos e sobrenaturais - muitos mesmo da sua experiência pessoal - ao longo dos quase 10 quilómetros do percurso. De repente, sentíamo-nos protagonistas d'"O Último Portal", de Roman Polanski (“The Ninth Gate”, 1999), do qual algumas cenas foram aliás filmadas nChalet Biester, na estrada da Pena.

Ouvindo as histórias de assombrações
e portais da Serra da Lua, 10.08.2013
E assim ouvimos a história do Quarto nº 18 do Hotel Tivoli, no Palácio de Seteais, assombrado pelo Conde que nele morreu; ou a história dos amores de D. Fernando de Saxe-Coburgo e da Condessa d'Edla, cujo Chalet foi consumido pelo fogo em 1999, quiçá observado pelo fantasma angustiado da condessa, entoando uma ária das que cantou no princípio da sua vida romanesca. Ou ainda a arrepiante história do "fantasma da boleia", ou a autêntica "chuva de pedras" da Quinta da Penha Verde, em 17 de Outubro de 1982: durante seis horas, as pedras da calçada apareciam no ar e caíam, fenómeno testemunhado por bombeiros, GNR e populares.
Portais secretos para uma outra dimensão?...
Mas também ouvimos as vivências da própria Maria João Martinho, como quando depara com a figura lúgubre de um homem amparado por um cajado, no meio da estrada, e a seguir vê um grupo de pessoas cobertas por mantas coloridas ... pessoas que o amigo que com ela circulava afirma que não vê; ou quando o seu carro continuava a trabalhar mesmo depois de desligado e retirada a chave da ignição, ou, noutra altura, quando se vê transportada, no seu carro, para uma estrada desconhecida, onde as acácias roçavam os vidros ... e de repente aparece no cruzamento da estrada dos Capuchos.
O Fauno, Casa do Fauno
Era já quase uma e meia de uma madrugada bem escura quando começámos a descer o caminho assombrado do Vale dos Anjos, onde por vezes as pessoas se sentem acompanhadas por entidades desconhecidas, ouvindo-se ruídos estranhos, passos, pancadas nas costas, reflexos talvez da passagem de cavaleiros templários ali perdidos no tempo. Trilho estreito e pedregoso, entre os muros da Penha Verde e da Regaleira, aqueles 900 metros de descida foram demorados ... provavelmente vigiados e protegidos pelo Rei Fauno...
Sem percalços de maior para além da escuridão, 15 minutos depois das duas da manhã terminávamos esta caminhada de sentidos pelos mistérios de Sintra, numa noite excepcionalmente quente. Com um grupo bastante menos numeroso, teríamos certamente ouvido o som das corujas, ou de qualquer outro animal da serra ... ou, quem sabe, teríamos recebido o contacto de alguma das muitas assombrações da Sintra assombrada, ou atravessado algum portal para uma outra dimensão...